10.25757/invep.v11i1.231
Artigos
Mapeamento do ensino do português na educação superior no Mercosul
Mapping
Portuguese teaching in Higher Education in Mercosur
L'enseignement
du portugais dans l'éducation post secondaire du
Mercosur
Mapeo de la enseñanza del portugués en la educación superior en el Mercosur
José Genival Bezerra Ferreira i
iUniversidade de Santiago de Chile, Chile
Resumo:
O artigo objetivou mapear o ensino do Português Língua Estrangeira (PLE) nas universidades públicas e particulares nos países fundadores do Mercado Comum do Sul - Mercosul (Argentina, Paraguai e Uruguai). Para tanto, investigamos todos os websites das universidades do Bloco, realizamos revisão bibliográfica e documental (leis e estatutos universitários), identificamos as graduações que ofertam a Língua Portuguesa (LP), bem como analisamos a grade curricular de cursos a fim de conhecer a carga horária letiva dedicada a esse idioma. Constatamos que, num total de 161 universidades, apenas 43 lecionam o idioma português numa graduação específica ou como unidade curricular. Também verificamos que o país que tem mais se empenhado na difusão do ensino da LP é a Argentina, ainda que timidamente, e a maioria das graduações que ofertam o português são da área econômica, turística e jornalística.
Palavras-chave: Mercosul; Educação Superior; Português Língua Estrangeira
Abstract
The article aims to map the teaching of
Portuguese as a Foreign Language in public and private universities in the
founding countries of the Mercado Comum do Sul - Mercosur (Argentina, Paraguay and Uruguay). To
accomplish this, we examined all the web pages of Mercosur universities, carry
out an update of bibliographies and documents (laws and university statutes),
identified undergraduate degrees offered in the Portuguese Language and
analyzed the curriculum of those degrees offered in order to know how many
semesters are devoted to this language. Out of a total of 161 universities,
only 43 teach the Portuguese language either in a specific undergraduate degree
or as a subject. We therefore conclude that the country which has been
the most involved in disseminating Portuguese teaching is Argentina, albeit
timidly, and that degrees offered in Portuguese are mainly in the areas of
economics, tourism and journalism.
Keywords: Mercosur; Higher Education; Portuguese as a
Foreign Language
Résumé
Cet article a pour objectif de dresser une carte de l'enseignement du portugais comme langue étrangère (PLE) dans les universités publiques et privées des pays fondateurs du Mercado Común del Sur - Mercosul (Argentine, Paraguay et Uruguay). Ces pays n’ont pas renforcé les politiques linguistiques de l’enseignement du portugais dans l’éducation post secondaire, compte tenu que la langue portugaise est la langue officielle du Bloc, a plus de locuteurs que l’espagnol dans la région et acquiert une grande pertinence à cause de l’importance économique du Brésil. Pour faire ceci, nous examinons toutes les pages Web des universités du Mercosur, nous faisons une révision bibliographique et documentaire (lois et statuts universitaires), nous identifions les cours de LP offerts au premier cycle et analysons le cursus de ces diplômes pour connaître le nombre de semestres consacrés à cette langue. Sur un total de 161 universités, seulement 43 enseignent la langue portugaise dans un diplôme spécifique du premier cycle ou en tant que matière. Nous sommes arrivés à la conclusion que le pays qui a le plus contribué à la diffusion de l'enseignement de la langue portuguaise, bien que timidement, est l'Argentine et que les diplômes offerts en portugais se retrouvent surtout dans les domaines de l'économie, du tourisme et du journalisme.
Mots-clés: Mercosur; Enseignement;
Post Secondaire; Portugaise.
Resumen
El artículo tiene como objetivo mapear la enseñanza de la Lengua Portuguesa Extranjera (PLE) en las universidades públicas y privadas de los países fundadores del Mercado Común del Sur - Mercosur (Argentina, Paraguay y Uruguay). Dichos países no han incrementado las políticas lingüísticas de la enseñanza del portugués en la educación superior, considerando que la Lengua Portuguesa (LP) es la oficial del Bloque, tiene más hablantes que el español en la región y adquiere relevancia dada la importancia económica de Brasil. Para ello, investigamos todas las páginas web de las universidades del Mercosur, realizamos una revisión bibliográfica y documental (leyes y estatutos universitarios), identificamos las carreras de pregrado que ofertan la LP y analizamos la malla curricular de esas carreras para conocer cuántos semestres dedican a ese idioma. En un total de 161 universidades, solo 43 enseñan el idioma portugués en una carrera de pregrado específico o como una asignatura. Llegamos a la conclusión que el país que más se ha involucrado con la difusión de la enseñanza de LP es Argentina, aunque tímidamente, y las carreras que ofrecen portugués, se encuentran en las áreas de economía, turismo y periodismo.
Palabras clave: Mercosur; Educación Superior; Portugués como Lengua Extranjera.
Submissão: 28/10/2020
Aceitação: 24/12/2020
Introdução
A língua portuguesa (LP) é falada
por aproximadamente 250 milhões de pessoas, sendo que só no Brasil são cerca de
210 milhões, segundo informações do Instituto Brasileiro de Estatística
(IBGE). Os demais falantes estão distribuídos pelos outros 8 países que
têm a LP como oficial e também por regiões da Ásia: Macau (na China), Goa,
Damão e Diu (na Índia), Malaca (na Malásia), Ilha das Flores (Indonésia) e Batticaloa (no Sri Lanka). É de mencionar ainda os países
que têm grandes comunidades portuguesas (Alemanha, França, Reino Unido e Suíça
etc.) e brasileiras (Estados Unidos, Paraguai, Japão e Reino Unido etc.), além
de ser língua oficial de várias instituições, como a União Europeia, o Mercosul
e a União Africana (Lewis, Gary, Fenning, 2014). O
português é considerado um dos dez idiomas “vitais” nos próximos 20 anos,
conforme o British Council of Languages .
No arco sul, o debate acerca da
real conjuntura educacional dos estados nacionais do Mercosul tem sido pauta
frequente em reuniões, cúpulas, convenções, etc. Nesse cenário, entra em
discussão o ensino das línguas oficiais do Bloco, por considerá-las como fator
de união e, sobretudo, de desenvolvimento da educação e da economia. Assim, o
ensino da língua portuguesa, na educação superior nos países de língua
espanhola fundadores do Bloco, tem sido tema de várias discussões e ganhado
cada vez mais relevância no Setor do Mercosul Educacional (Nascimento, 2010).
Tendo em vista essa
representatividade que a LP tem no mundo e, com efeito, no âmbito do Mercosul,
refletimos sobre a situação atual do ensino desse idioma na educação superior
no Bloco. Questionamo-nos, assim, quais universidades ensinam o PLE e em quais
graduações está presente como disciplina obrigatória. E quando há a língua
portuguesa em determinadas graduações/licenciaturas, quantos semestres letivos
são dedicados a essa língua.
Isso posto, o objetivo principal
do trabalho é mapear o ensino do português como língua estrangeira na educação
superior (pública e privada) nos países fundadores do Mercosul.
Para mapearmos a oferta da LP,
realizamos revisão bibliográfica, documental e análise das grades curriculares
das graduações/licenciaturas presentes nas universidades do Mercosul. O
procedimento foi realizado em três fases: a primeira foi acessar,
de 1 de setembro a 30 de outubro de 2019, os websites dos órgãos oficiais
responsáveis pelo credenciamento e pela autorização do funcionamento dos cursos
de graduação/licenciatura a fim de verificar quais universidades públicas e
particulares estão credenciadas e autorizadas a funcionar para em seguida
proceder a pesquisa nos websites de cada universidade. Acedemos, na Argentina,
à Comisión Nacional de Evaluación
y Acreditación Universitaria,
no Paraguai, à Agencia Nacional de Evaluación y Acreditación de la Educación
Superior e, no Uruguai, ao Ministerio de Educación y Cultura. Num segundo momento, ingressamos
nos sites das instituições e analisamos os planos de estudo e grades
curriculares das graduações e licenciaturas que porventura poderiam oferecer
português. Num terceiro momento, organizamos as informações em quadros
por país com os nomes das universidades, a designação dos cursos e o número de
semestres dedicados ao ensino do PLE como disciplina obrigatória. Por questão
de delimitação, não incluímos em nosso estudo instituições de ensino que
ofertam cursos superiores que não são designadas “universidade” nem os cursos
que se encaixam na categoria “livre ou optativo”.
Mercosul: políticas educacionais e linguísticas
O Mercosul é um processo de
integração econômica entre Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela
(mais recente membro, que teve seus direitos e obrigações suspensos). Teve seu
início com o Tratado de Assunção em 26 de março de 1991. O Bloco foi criado com
o intuito de que os países integrantes juntassem esforços para um mercado comum
que tivesse como resultado a livre circulação de bens, serviços, o
estabelecimento de uma tarifa externa comum e a adoção de uma política
comercial frente a terceiros Estados ou blocos econômicos.
O Bloco tem passado por algumas
reconfigurações, sendo as mais recentes: a incorporação plena da Venezuela em
2012 (e suspensão em 2017, por ruptura democrática),
a suspensão do Paraguai entre 2012 e 2013, porque o então presidente do país,
Fernando Lugo, havia sido destituído de seu cargo (a destituição foi vista como
quebra de ordem democrática do país) e o processo de adesão da Bolívia como
país membro, que se prolonga até os dias atuais.
Para Ferreira (2020), os ganhos
do bloco no campo diplomático – de aproximar países na região e fazer
contraponto ao Norte – ganham força com a ampliação. Nesse cenário, o Brasil
sai beneficiado ao ampliar o mercado para seus produtos e garantir suprimento
energético. Durante as suas três décadas de existência, o Mercosul se reafirmou
internacionalmente, por ser considerado uma área de estabilização econômica e
política e recolocou os países que dele fazem parte na economia mundial. Em 28
de junho de 2019, no Japão, na Cumbre dos G20, os
países membros do Mercosul assinaram acordo comercial histórico com a União
Europeia.
No Tratado de Assunção é notório
a preponderância de questões econômicas. Somente o preâmbulo da Lei, no último
parágrafo, se alude à questão político-social: “... vontade política de deixar
estabelecidas as bases para uma união cada vez mais estreita entre seus
povos...” (1991, p.1). Essa questão vem demonstrar que o Tratado desde seu
nascimento ganhou sentido econômico, tornando-se inclusive razão de alguns
desentendimentos entre Argentina e Brasil, a citar um caso: a União Europeia
passou a ocupar o primeiro lugar de comprador dos produtos agrícolas, de couro
e outros produtos argentinos.
Por outro lado, destacam Santos Bucco e Alves Fortaleza (2013) que o Mercosul não se
restringe à questão econômica em que, em seu início, o objetivo era romper com
as fronteiras para a liberação de serviços, bens e fatores produtivos, que de
alguma forma continuam. Para os autores do estudo, no entanto, o que deslocou
foi o foco da visão puramente econômico-política para uma visão
social-científica, em que a educação e a mobilização de pessoas são os
protagonistas agora.
Nesse âmbito, focando a educação,
em 13 de dezembro de 1991, foi criado o Setor Educacional do Mercosul-SEM,
época em que os ministros da educação assinaram o Protocolo de Intenções.
O SEM foi instituído com base na ideia de que a integração regional não deve
estar circunscrita somente aos aspectos econômicos e
políticos, mas deve abrigar iniciativas culturais, educativas e sociais. O
Protocolo estabelece que “a educação tem papel fundamental para que a
integração se consolide e se desenvolva” (1991, p. 1). O objetivo geral
do SEM, nessa perspectiva, consiste em construir um
espaço educacional integrado por meio da coordenação de políticas de educação,
promovendo a mobilidade, o intercâmbio e a formação de uma identidade regional.
Com efeito, as intenções
que subjazem às propostas apontam em duas direções: forjar uma identidade comum
aos países membros e qualificar a mão-de-obra regional para garantir a inserção
competitiva do bloco (Ferreira, 2020).
Não podemos desvincular a
educação das políticas internacionais. Pensando assim, em um nível
macrorregional, entendemos que as proposições e discussões no âmbito do SEM
também são políticas educacionais, uma vez que afetam ou podem afetar
diferentes instâncias e sistemas educacionais nos países que dele fazem parte.
O Tratado de Assunção também
destaca a necessidade de criar uma planificação linguística que incentive o uso
do espanhol e do português. Observamos no Art.17 do referido
Tratado: “Os idiomas oficiais do Mercado Comum serão o português e o
espanhol e a versão oficial dos documentos de trabalho será a do idioma do país
sede de cada reunião”.
Conforme afirma Sousa
(1998), um dos aspectos em que houve maior atenção e
destaque nos documentos diz respeito à educação no campo do incentivo ao
ensino-aprendizagem dos idiomas oficiais do Mercosul: o português, o
espanhol e o guarani.
O SEM e a Comissão de Educação
Básica priorizam as políticas nacionais e buscam resolução de problemáticas
comuns aos países, de acordo com as prioridades definidas do Setor. Nesse
contexto, há blocos temáticos que orientam todos os projetos que fazem referência
a línguas e aos aspectos curriculares como a
aprendizagem das línguas enquanto processo cultural e a incorporação de
projetos sobre ensino de línguas, reconhecendo-as pela dimensão política que
têm para a integração regional.
Verificamos também no Plan del Sector Educativo del Mercosur (2006-2010), nas
metas para a educação básica, que consta a criação de centros de estudo de
língua e literatura dos idiomas oficiais do Mercosul: “Promover la creación de cátedras y/o espacios
académicos que impulsen el conocimiento
y difusión de la lengua y
literatura de los idiomas oficiales del Mercosur” (p. 25). Vale
ressaltar que, no item criação de centros de
línguas, no Art.3 da Lei 11.161/2005, refere-se que o ensino de língua
espanhola se torna obrigatório no ensino médio no Brasil, porém a Medida
Provisória nº 746 de 2016 que reformulou o ensinou médio no Brasil retirou essa
obrigatoriedade.
Quanto ao ensino superior,
observamos que as principais temáticas abordadas no SEM dizem respeito à
acreditação de cursos, mobilidade acadêmica de alunos e professores e acordos
de admissão de títulos, sem destaque relevante para o ensino do PLE.
Nessa perspectiva,
Silveira (2016) destaca que, no contexto do SEM, estão sendo criadas
estratégias que facilitam o reconhecimento e a padronização/equiparação de
estudos, bem como a livre circulação de estudantes, o intercâmbio entre
professores universitários, tanto de graduação quanto de pós-graduação, com o
objetivo de promover a integração e a regionalização da educação superior.
Como Portugal, o Brasil tem seus
vizinhos falantes de espanhol. Da Venezuela ao Uruguai são aproximadamente 14
mil quilômetros de fronteira com 8 países hispano-falantes. Antes dos acordos
do Mercosul, a divulgação e ensino do português nos países da América do Sul
era feita eventualmente por meio dos leitorados ligados ao Ministério das
Relações Exteriores (no caso do Brasil) e do Instituto Camões (no caso de
Portugal). Com o advento do Mercosul, abriram-se novas oportunidades para a
formação de professores de língua portuguesa na Argentina, no Paraguai e no
Uruguai para ensinarem português em cursos livres, na educação básica e na
educação superior (em menor escala).
Ao longo dos anos, as Políticas
Linguísticas são entendidas como políticas públicas de responsabilidade do
Estado no que diz respeito às línguas, em suas muitas especificidades, que
envolvem desde a implantação à manutenção de projetos e/ou programas em
determinada sociedade. Por assim ser, a relação entre os estudos da linguagem e
Estado é uma questão que aflora como área de estudo (Oliveira, 2017).
Desse modo, a discussão
acerca de Políticas Linguísticas ocorre em diversos países em que se há mais de
uma língua em uso, abrangendo questões sobre bilinguismo, principalmente em
regiões de fronteira, as chamada línguas de contato, a
relação entre dialetos e língua standard, entre outras Oliveira, (2017). Há que
mencionar, contudo, que esse debate também está presente em países considerados
monolíngues, como é o caso do Brasil, em que se considera
apenas o português como língua oficial. No país, as discussões vão além e
abarcam questões relacionadas com as normas, a pedagogia de variação
linguística, os estrangeirismos, bem como as políticas públicas que envolvem a
educação (Faraco e Zilles,
2015).
Nesse sentido, para Calvet (2007), não se pode separar política linguística de
sua aplicação, isto é, de seu planejamento, o que
assenta na ideia de que política linguística implica questionamentos
científicos da língua em uso e a elaboração de intervenções oficiais e ainda
diz respeito aos meios para que ponham em prática as intervenções que envolvem
a(s) língua(s), criando “novas maneiras” de abordar as relações entre língua e
sociedade.
As Políticas Linguísticas,
segundo Spolsky (2005), devem ser entendidas não
apenas como política oficial. Com esse olhar, devem se orientar para os estudos
das práticas de linguagem. O autor sugere que as Políticas Linguísticas
deveriam, assim, explorar três dimensões: (i) as práticas de linguagem dos
membros da comunidade discursiva, (ii) as crenças de
seus membros no que diz respeito à língua e (iii) os
esforços dos membros para mudar as práticas e as crenças existentes. Dito
de outra forma, quando se trata de política linguística, devem ser consideradas
as crenças e a ideologia da comunidade em que a língua vai ser objeto de
investigação, o que significa dizer que as propostas oficiais também estão
permeadas dessas crenças e ideologias.
Consoante Angelucci
e Pozzo (2018), na América Latina, no que tange às
Políticas Linguísticas, houve três etapas importantes, a saber: a primeira, em
síntese, ocorreu durante o período dos primórdios da Guerra Fria, como
decorrência da divisão do mundo em dois eixos e as descolonizações tardias dos
países asiáticos e africanos. Nesse período, houve a necessidade de tentar
organizar o mundo que estava dividido por questões políticas e linguísticas. As
autoras destacam ainda o desenvolvimento da linguística aplicada nessa época,
bem como assinalam que emergem as bases da glotopolítica,
a definição de categorias de línguas, questões de bilinguismo, diglossia, a
linguística de corpus e a de status. Acrescem ainda que, no âmbito latino
americano, há duas línguas majoritárias: o espanhol e o português. Somente três
países na América do Sul, de língua espanhola, têm outro idioma oficial, além
do espanhol: Peru (quéchua), Paraguai (guarani) e Bolívia (quéchua e aimará).
A segunda etapa,
de acordo com Angelucci e Pozzo
(2018), tem como lema a defesa das línguas minoritárias que ocorreu entre os
anos 1970 e 1985. Nesse contexto, entram em discussão as línguas regionais dos
estados nacionais e a atenção é dada a situação linguística de países que
tiveram sua independência na década de 70 até meados dos anos 80. Essa etapa
reúne três bases fundamentais: a alemã - língua como característica essencial
para o reconhecimento de uma nação; a francesa - língua resultante do
desenvolvimento histórico capitalista, produz-se
a ficção duma comunidade de língua como base da nação e, por último, a concepção dos estados multinacionais - nação é
definida pela comunidade de destino que pode ou não coincidir com a comunidade
de língua (Angelucci e Pozzo,
2018).
Na terceira e última etapa, ainda
segundo Angelucci e Pozzo
(2018), os fundamentos das Políticas Linguísticas se referem à
internacionalização das línguas. Os projetos transnacionais consolidam as áreas
idiomáticas, como o da francofonia. O tema é abordado de uma maneira
multidisciplinar. Há também nessa fase a catalogação de uma variedade de
línguas com o intuito de estabelecer novos critérios para reconhecer quais
línguas precisariam de intervenção e quais aquelas que não precisariam.
Nesse sentido, nosso trabalho se
insere nas investigações que têm se desenvolvido no campo da glotopolítica, especificamente, sobre o ensino de línguas
estrangeiras (Arnoux e Bein,
2015) e instrumentos linguísticos (Arnoux, 2016).
Isso significa que estamos em uma corrente que entende políticas de linguagem
em um sentido amplo, considerando não apenas as ações realizadas pelo Estado
por meio da legislação linguística e planejamento,
mas também representações sociolinguísticas, o que pode levar ao seu fracasso (Bein, 2013).
Por outro lado, cabe mencionar que, sobre políticas educacionais e linguísticas,
tendo como pano de fundo o Mercosul, ainda que haja o SEM e o Grupo de Trabalho
de Políticas Linguísticas, mostra-se necessário um permanente debate
social entre os atores sociais que promovem o ensino de língua portuguesa na
educação superior, sobretudo, para fazer operar a transnacionalização
da legislação linguística, de modo que se faça cumprir o que já é lei, como
indicam Salgado e Boschi (2016).
Mapeamento da língua portuguesa no Mercosul
Nesta seção do artigo,
apresentamos alguns elementos, organizados por meio de quadros, os países, a
relação de universidades, as graduações e licenciaturas que oferecem PLE, bem
como lançamos um olhar para os programas e grades curriculares desses cursos a
fim de entender as várias áreas em que o português está inserido e com quais propósitos.
Cabe mencionar, a título de
sugestão para outras investigações, os cursos de formação de professores, os Profesorados, na educação terciária, com quatro anos de
duração, que existem na Argentina e no Uruguai. Por exemplo, em Buenos Aires,
pode-se estudar Profesorado de Portugués
no Instituto de Lenguas Vivas Juan Ramón Fernandéz,
institutos semelhantes há em Montevideu. No Paraguai, inexiste esse tipo de instituto.
Argentina
A República da Argentina tem 24
províncias, sendo que algumas delas fazem fronteira com o Brasil. A
fronteira tem um total de 1.132 km de extensão. Muitas das cidades argentinas e
brasileiras dessa região convivem com o português e o espanhol diariamente, as
chamadas cidades gêmeas, que estão localizadas notadamente nas províncias de Misiones e Corrientes (do lado argentino) com as cidades do
Rio Grande do Sul (do lado brasileiro). Mesmo que,
segundo Müller de Oliveira e Morello (2019, p. 57), “o contato entre as línguas na
fronteira hispano-portuguesa na América do Sul, com poucas exceções, produz uma
relação assimétrica, com os hispano-falantes tendo mais proficiência em
português que os brasileiros em espanhol”.
O contato dos argentinos com o
português na região de fronteira não se daria apenas informalmente, estaria
presente na educação básica e nas universidades onde estão localizadas tais
cidades gêmeas, no entanto, a maioria das iniciativas das Políticas
Linguísticas está voltada para a educação básica. Nessa região fronteiriça,
existe o Programa das Escolas Interculturais Bilíngues de Fronteira- PEIBF como
política de gestão do bilinguismo português/espanhol, como apontam Müller de Oliveira e Morello
(2019).
A Argentina tem 100
universidades, sendo 50 públicas e 50 particulares. Desse total, apenas
32 oferecem a língua portuguesa como unidade curricular (disciplina) ou como
graduação (carrera de grado, pregrado
ou licenciatura). Vejamos o Quadro 1 abaixo.
Quadro 1: Universidades argentinas que ofertam PLE
Universidades com LP |
Designação dos cursos que oferecem |
Nº de semestres |
Universidad Kennedy |
Licenciatura en Administración Hotelera |
2 |
Licenciatura en Turismo |
2 |
|
Licenciatura en Comercio Exterior |
2 |
|
Universidad Atlántida Argentina |
Licenciatura en Comercialización |
2 |
Universidad Bras Pascal |
Contador Publico |
1 |
Licenciatura en Turismo |
2 |
|
Licenciatura en Per. y Nuevos Medios |
1 |
|
Licenciatura en Com. Institucional |
1 |
|
Universida CAECE |
Licenciatura en Turismo |
1 |
Licenciatura en Turismo |
1 |
|
Universidad Católica de Salta |
Licenciatura en Comercio Internacional |
2 |
Universidad de Belgrano |
Licenciatura en Gastronomía |
2 |
Universidad de Ciencias Empresariales y Sociales |
Licenciado en Rel. Públ. e Institucionales |
2 |
Licenciatura en Turismo |
3 |
|
Universidad de Congreso |
Comercio Exterior |
2 |
Comunicación |
3 |
|
Licenciatura en Turismo |
3 |
|
Relaciones Internacionales |
2 |
|
Universidad de Mendoza |
Licenciatura en Adm. de Negocios |
2 |
Administración de Negocios |
2 |
|
Contador Público |
4 |
|
Universidad de Moron |
Licenciatura en Gestión Hotelera |
3 |
Licenciatura en Turismo |
3 |
|
Universidad del Aconcagua |
Licenciado en Relaciones Institucionales |
1 |
Universidad del Centro Educativo Latinoamericano |
Licenciatura en Adm. de Emp. de Turismo |
2 |
Licenciatura en Adm. de Hotelera |
2 |
|
Licenciatura en Comercialización |
2 |
|
Licenciatura en Turismo |
2 |
|
Licenciatura en Comunicación Social |
2
|
|
Universidad del Salvador |
Turismo |
2 |
Traductorado Científico Lit. en Portugués |
8 |
|
Traductorado Público en Portugués |
6 |
|
Universidad de la Marina Mercante |
Licenciado en Marketing |
2 |
Universidad Champagnat |
Licenciatura en Comercio Internacional |
2 |
Licenciatura en Turismo |
4 |
|
Universidad de San Pablo |
Periodismo |
2 |
Universidad Autónoma de Entre Ríos |
Profesorado en Portugués |
8 |
Traductorado en Portugués |
8 |
|
Licenciatura en Leng. Ext. Portugués |
8 |
|
Turismo |
2 |
|
Universidad Nacional de Entre Ríos |
Profesorado en Portugués |
4 |
Turismo |
2 |
|
Universidad Nacional de Córdoba |
Profesorado de Portugués |
6 |
Profesorado de G. Universitario/Portugués |
7 |
|
Licenciatura en Turismo |
4 |
|
Licenciatura en Turismo |
3 |
|
Licenciatura en Periodismo |
1 |
|
Universidad Nacional de Chilecito |
Guía Universitario de Turismo |
3 |
Universidad N. de General Sarmiento |
Licenciatura en Comunicación |
2 |
Profesorado en Portugués |
10 |
|
Universidad Nacional de Luján |
Licenciatura en Comercio Internacional |
2 |
Universidad Nacional de Misiones |
Profesorado en Portugués |
8 |
Universidad Nacional de Quilmes |
Licenciatura en Comercio Internacional |
1 |
Universidad Nacional Rio Negro |
Licenciatura en Comercio Exterior |
2 |
Licenciatura en Hotelería |
2 |
|
Licenciatura en Turismo |
2 |
|
Universidad Nacional de Rosario |
Profesorado en Portugués |
8 |
Licenciatura en Portugués |
8 |
|
Traductorado de Portugués |
8 |
|
Universidad Nacional San Juan |
Licenciatura en Turismo |
2 |
Universidad Nacional de San Luis |
Licenciatura en Turismo |
2 |
Licenciatura en Hotelería |
2 |
|
Universidades: 32 |
Cursos: 62 |
Semestres: 200 |
Fonte: elaborada pelo autor
O Quadro 1 apresenta um total de
32 universidades com 62 graduações e 200 semestres com disciplinas relacionadas
à PLE. Constatamos também que apenas nove graduações são específicas para
formação professores de PLE com as seguintes nomenclaturas: Licenciatura en Portugués, Profesorado
de Portugués, Licenciatura de Lengua
Extranjera-Portugués. Esses cursos são oferecidos em
universidades nacionais, ou seja, públicas. Os outros cursos são de áreas
relacionadas ao comércio/economia (com 18 graduações, como Licenciatura en Comercio Exterior, Contador Público, Licenciatura en Administración de Negocios, Marketing etc. ); ao turismo (24 cursos, como
Turismo, Licenciatura en Turismo, Licenciatura en Hotelería etc.); à comunicação
(seis cursos: Periodismo, Comunicación, Licenciatura en Comunicación Social etc.); à
tradução (quatro cursos: Traductorado Publico en Portugués, Traductorado
Cientifico Literario, Traductorado
de Portugués e Traductorado
en Portugués) e um curso de
Licenciatura en Gastronomia na Universidad
de Belgrano em Buenos Aires.
Além disso, percebemos que a
oferta da língua portuguesa na educação superior na Argentina ocorre com
denominações diferentes para os cursos de graduação: Licenciatura, Bacharelado
e Traductorado. Ademais, temos os cursos de idioma
para fins específicos, idioma para a comunidade não acadêmica e projetos de
extensão, que não foram objeto de nosso estudo. Estes últimos marcam uma
tendência para a inserção da língua e cultura portuguesa nas universidades.
A análise das grades curriculares
e planos de cursos nos levaram a perceber a predominância do inglês no ensino
superior, tanto nos cursos de formação de professores, quanto nos cursos das
áreas econômicas/de turismo, ainda que, conforme The Obervatory of Economic
Complexity, o principal parceiro comercial da
Argentina seja o Brasil e a Argentina seja o terceiro parceiro comercial do
Brasil. Segundo a Secretaría de Turismo de la Nación da Argentina, somente no ano de 2018, foram
1.318.148 turistas brasileiros que chegaram a terras argentinas, o que
significa o maior fluxo de turistas no país, sendo esse número maior do que o
resto de toda a América Latina. De acordo com esses dados e considerando o
valor econômico da LP, a Argentina não dá à apropriada relevância, ao priorizar
o inglês, ainda que o português mobilize mais a economia. Por outro lado, esse
fato, com efeito, aplica-se também às áreas de comunicação, gastronomia, tradução etc. Não se trata de posicionar a língua inglesa em
uma condição menos importante, porém, sobretudo, de colocar o português,
talvez, no mesmo patamar dessa língua e valorizá-la pelo seu potencial
econômico que move, parte significante, da economia
argentina, sem mencionar outros setores.
Gil (2009) corrobora a questão de
que na Argentina o inglês é a língua estrangeira mais ensinada em todos os
níveis de ensino. Para a autora, 80% das licenciaturas para o ensino de línguas
estrangeiras são de língua inglesa. E acrescenta que o ensino da língua inglesa
é obrigatório desde o primeiro ano nas escolas primárias na cidade de Buenos
Aires. Segundo Varela (1999), o predomínio do inglês pode ser explicado pelo
valor simbólico, cujo domínio, na sociedade argentina, é caracterizado como
forma de ascensão social. Não obstante, o idioma de Saramago e Machado de Assis
é o segundo idioma mais estudado na Argentina. Nos últimos anos, ultrapassou o italiano e o alemão em termos de
oferta e procura.
O
aumento da oferta de licenciaturas em formação de professores PLE, na
Argentina, que está prevista na Lei 26.468/2009, tem
a inserção ainda embrionária. Nota-se que muitas escolas não incluíram o
português em seus curriculos pelo fato de que as
províncias têm autonomia de implantá-lo ou não, em conformidade com a Lei
mencionada. Ainda sobre essa questão, Canteros (2017)
afirma que o ensino do português na Argentina continua ligado a questões de
ordem política, econômica, cultural e ideológica. Para o autor, essa questão
começou nas primeiras tentativas de aproximação de ambos países, o mesmo
ocorreu entre os atores sociais no âmbito da cultura, dado que os vínculos
sempre “foram muito complexos, indo da desconfiança e concorrência permanente
em decorrência das necessidades de cada Estado para garantir o interesse
nacional, a segurança exterior e a soberania, até a promoção da cooperação, a
interdependência e a integração” (Canteros, p. 1
2017).
Sugerimos ainda que algumas
medidas poderiam ser aplicadas com a finalidade de impulsionar o ensino do
português na Argentina, como, a título de exemplo, a expansão da oferta de
cursos de formação de professores no nível universitário para argentinos,
considerando que a maioria dos professores de PLE na Argentina é brasileira,
com formação no Brasil, residente no país
(Ferreira, 2020). Além do mais, a nível macro, seria relevante estabelecer
políticas educacionais e linguísticas para posicionar o português com o status
de língua regional, não língua estrangeira, incluindo-a como obrigatória em
algumas graduações, a fim de se criar uma consciência crítica em relação ao
“ensino exagerado” do inglês e, por fim, a criação de uma consciência da
importância do plurilinguismo na região a começar pelo âmbito universitário.
Paraguai
Brasil e Paraguai compartilham
1.339 Km de fronteira – a quarta maior extensão de fronteira. O Brasil é o
principal parceiro comercial do Paraguai. Em 2018, para exemplificar, absorveu
mais de 30% de todas as exportações paraguaias, inclusive a energia de Itaipu
não consumida pelos paraguaios é comprada pelo Brasil. Ainda segundo dados do
Itamaraty, o Paraguai é o segundo país com maior número de brasileiros, ficando
apenas atrás dos Estados Unidos.
A presença do idioma português no
Paraguai é relativamente recente e está presente em vários departamentos,
notadamente naqueles que fazem fronteira com o Brasil. A LP está relacionada
com o aumento da agricultura, em áreas do Estado do Paraná e do Rio Grande do
Sul, que levaram os agricultores a comprar terras na região de fronteira com o
Brasil. Podemos observar que isso ocorreu, em especial, nos departamentos de Canindevú e Alto Paraná. Essa questão deu origem a uma
população chamada brasiguaios, que, consoante Müller de Oliveira e Morello
(2019), aproxima-se de 500 mil pessoas. Para os autores, esse fenômeno
estabeleceu uma espécie de fronteira política e linguística.
O Paraguai possui 54
universidades, sendo 8 públicas e 46 privadas, e apenas oito têm PLE. O
Quadro abaixo apresenta o cenário.
Quadro 2: Universidades paraguaias que ofertam PLE
Universidades com LP |
Designação dos cursos com LP |
Nº de semestres |
Universidad Nacional de Asunción |
Licenciatura en Lengua Portuguesa |
4 |
Universidad Téc. de Com. y Desarrollo |
Relaciones Internacionales |
2 |
|
Comercio Exterior |
2 |
Hotelería y Turismo |
4 |
|
Ciencias de la Com. Social/Periodismo |
1 |
|
Marketing |
4 |
|
Universidad Artística y Politécnica del Paraguay
|
Hotelería y Turismo |
4 |
Comunicación Bilingüe Cast. – Portugués |
4 |
|
Periodismo |
4 |
|
Relaciones Publicas |
4 |
|
Universidad del C. S. de las Américas |
Licenciatura en Com. Social |
1 |
Universidad San Ignacio de Loyola |
Administración de Empresas |
1 |
Marketing |
1 |
|
Universidad Autónoma de Encarnación |
Licenciatura en Hotelaría y Turismo |
2 |
Licenciatura en Rel. Púb. e Institucionais |
1 |
|
Universidad Nihon Gakko |
Admistración de Empresas |
1 |
Universidades: 8 |
Cursos: 15 |
Semestres: 40 |
Fonte: elaborada pelo autor
Uruguai
O Uruguai tem uma fronteira de
1068 km com o Brasil. Em algumas áreas dessa fronteira se fala o português
conhecido como portunhol riverense
ou, apenas, portunhol. É falado em cidades como
Artigas e Quaraíy no Uruguai e Santana no Livramento
no Brasil. Mozzillo (2013),
afirma que a origem do portunhol se deve a
colonização portuguesa na região norte do Uruguai, que sofreu sucessivas
disputas entre Portugal e Espanha, caracterizando-se por uma mistura das duas
línguas.
No Uruguai existem atualmente sete universidades oficialmente credenciadas: duas públicas e cinco privadas. No Quadro 3 a seguir as universidades que ensinam português numa graduação.
Quadro 3: Universidades uruguaias que ofertam PLE
Universidades com LP |
Designação dos cursos com LP |
Nº de semestres |
Universidad de la Republica |
Traductor Público |
2 |
Relaciones Internacionales |
1 |
|
1 |
||
Licenciatura en Turismo |
1 |
|
Licenciatura Binacional en Turismo |
1 |
|
Universidad de la Empresa |
Relaciones Internacionales |
4 |
Escribanía |
2 |
|
Abogacía |
2 |
|
Universidad Catolica |
Licenciado em Dir. de Empresas Turisticas |
2 |
Negocios Internacionales e Integración |
2 |
|
Universidades: 3 |
Cursos: 10 |
Semestres: 18 |
Fonte: elaborada pelo autor
O Quadro 3 revela que somente
três universidades, das sete que recebem a nomenclatura “universidade”, têm a
LP como uma unidade curricular. A Universidad de la
República é a única instituição pública que tem cinco graduações com a
PLE: Traductor Público, com duas disciplinas
intituladas Taller de la Lengua
Portuguesa e Cultura de la Lengua Portuguesa, cada
uma com um semestre (no quarto e último ano). A grade curricular dessa
licenciatura é de 1988. Cabe destacar também que, além do português, do plano
de curso constam o italiano, o alemão, o francês e o inglês como línguas
estrangeiras com carga horária superior ao português, além da língua materna, o
espanhol, com seis semestres dedicados ao seu ensino. Na mesma universidade, há
os cursos relacionados com o turismo (Licenciatura en
Turismo e Licenciatura Binacional en Turismo), o
comércio (Relaciones Internacionales) e a comunicação
(Licenciatura en Ciencias
de la Comunicación). Esses cursos contam apenas com
um semestre em LP.
Já a Licenciatura en Relaciones Internacionales
conta com quatro semestres de LP e seis de inglês. Na carrera
de Escribanía e Abogacía os
estudantes têm dois semestres de LP. Fato que nos chamou atenção é que a única
graduação em Derecho (dos três países objeto de nosso
estudo) que conta com LP na grade curricular é a da Universidad
de la Empresa, com a designação Portugués Juridico I e II. Cabe mencionar também que a Universidad de la República é a única do bloco que tem um
curso, no caso, o de Marketing, com a designação Mercosul, ou seja, Uruguay y Mercosur. Embora no
Uruguai não haja nenhuma universidade que forme professores de PLE, há os
institutos universitários que têm o Profesorado en Portugués, aspecto
que não focamos, uma vez que não fez parte da delimitação de nosso estudo, como
já exposto.
Diferentemente da Argentina e do
Paraguai, o português está presente em terras uruguaias, no norte do país,
desde o século XVII, resultado dos fluxos colonizadores e migratórios
empreendidos por portugueses até o século XIX e, em momento posterior, por
brasileiros. Assim, a ocupação do norte uruguaio se deu historicamente de forma
conjunta com a colonização portuguesa do sul do Brasil, com destaque para o
estado do Rio Grande do Sul, de onde brasileiros continuaram migrando durante o
século XX, de modo que milhares de uruguaios que moram no norte do país tem o
português como língua materna. O chamado dialeto português uruguaio é falado
por aproximadamente 15% da população
Para respaldar essa questão,
Carvalho (2006) destaca que o reconhecimento científico e linguístico da língua
portuguesa como língua materna do Uruguai também foi consequência da luta
constante e da participação recente de linguistas em comissões de educação no
Uruguai sobre a inserção do ensino bilíngue nas escolas uruguaias, em tempo
integral. Ainda ressalta que desde o ano 2000 o português brasileiro é
reconhecido no sistema educacional uruguaio.
No que diz respeito ao ensino da
língua portuguesa, possivelmente, o Uruguai tenha dado mais passos adiante no
ensino dessa língua, pois está na educação desde o Tratado do Mercosul, em
1991, mesmo que seja na educação básica. Atualmente são 93 escolas do ensino
fundamental e 22 no ensino médio, onde o português é aprendido, por opção,
durante três horas por semana
Discussão dos resultados
O mapeamento do ensino da língua
portuguesa na educação superior nos países do Mercosul evidenciou que o ensino
é incipiente e pouco se tem avançado, tanto nas universidades públicas quanto
nas privadas. Como é de conhecimento, o Mercosul tem um enorme potencial
econômico, sobretudo por causa do Brasil. Ficando atrás apenas dos Estados
Unidos, o país tem o segundo maior Produto Interno Bruto (PIB) de toda a
América ((IIP, 2018), pelo que se esperava que a LP, como língua oficial
do país, tivesse maior peso na região, considerando que a língua está
diretamente conectada com todos os fatores da vida e que as universidades têm,
entre outras funções, a de preparar os indivíduos para enfrentar o
mercado de trabalho e contribuir para a expansão econômica da região (e do
mundo), de modo que venha melhorar a vida das pessoas. Os dados revelam-nos que
não está sendo dada a devida importância a LP no meio acadêmico. Na Tabela 1,
sumarizamos o que discutimos até agora a fim de compararmos.
Tabela 1: Universidades do Mercosul que ofertam PLE
Nº de Universidades por país |
Nº de universidades que tem a LP como unidade curricular ou graduação |
Nº de graduações que tem a LP como unidade curricular |
Nº de cursos que formam professores de PLE |
|
Argentina |
100 |
32 |
51 |
11 |
Paraguai |
54 |
8 |
14 |
1 |
Uruguai |
7 |
3 |
10 |
0 |
Total |
161 |
43 |
75 |
12 |
Fonte: elaborada pelo autor
Do total de universidades
argentinas, apenas 32% delas têm alguma graduação ou disciplina ligada à LP e
há apenas 11 cursos que formam professores de tal língua em todo o território,
o que leva a maioria dos professores de LP ser brasileira. No Paraguai, apenas
14,8% do universo de 54 universidades têm LP e o mais preocupante é que há
apenas um curso de formação de professores de PLE, o da Universidad
Nacional de Asunción, que inclusive foi instituído
com ajuda do estado brasileiro. No estado uruguaio, 42,8% das universidades
ofertam a língua portuguesa em forma de cursos ou disciplinas ao passo que não
há nenhuma licenciatura de formação de professores de português em instituições
nomeadas como “universidades”. No entanto, há os institutos superiores de
educação que formam professores de língua portuguesa, que não compõem objeto de
nosso estudo.
Esses dados refletem que não há
uma Política Linguística contundente que encare os desafios para o
fortalecimento do ensino do português. Constatamos, como já aferido, que
o inglês ganha o terreno (e muito), mesmo que o maior parceiro comercial da Argentina,
do Paraguai e do Uruguai seja o Brasil, como preconizam Teles et al. (2019).
Constatamos, como Angelucci e Pozzo (2018), que,
mesmo com os avanços institucionais e legislativos, muito precisa se avançar,
tanto no âmbito político e executivo, para implementar com eficiência e
eficácia as mudanças que estão prescritas nas leis, bem como aprofundar o
conhecimento sobre novas perspectivas do ensino do
português. Para tanto, implica ir além das imposições impulsadas pelas
políticas linguísticas das grandes potências, que colocam o inglês no pedestal,
dando-lhe quase que exclusividade como idioma universal.
É importante que se derrubem estereótipos para a compreensão de que as línguas abrem portas à construção global de comunidades mais empáticas ao outro, ao diferente. Além do mais, a multiplicidade cultural e a diversidade linguística, bem como o plurilinguismo, desvelam-se como estratégias políticas e sociais que devem fazer parte do dia a dia do cidadão.
Palavras (por ora) finais
Como podemos verificar, são
muitas as formas como a PLE é introduzida nas universidades públicas e
particulares na Argentina, no Paraguai e no
Uruguai. Os programas de graduação na área da economia e do turismo são os que
mais incorporam a língua portuguesa como disciplina. Também foram encontrados
cursos da área de comunicação, de tradução, de gastronomia e de direito, ainda
que o português seja só abordado num semestre e, por último, as graduações que
formam professores de PLE.
As informações recolhidas nos
websites das universidades nos revelaram que um número mínimo de graduações na
educação superior oferece a disciplina LP, bem como cursos de PLE. Faz-se
necessário que voltemos às perguntas que nortearam este trabalho: Quantas e quais universidades ensinam o português? Num total
de 161 universidades existentes nos três países, apenas 43 delas têm LP como
unidade curricular ou como cursos de PL e L2 em licenciaturas para formar
professores de PLE.
Quanto à segunda pergunta, Em
quais graduações está presente o português como disciplina obrigatória?,
os cursos estão divididos nas áreas econômica, turística, comunicacional,
tradução e formação de PLE. Em relação à questão Quando há a língua portuguesa
nas grades curriculares/planos de curso das graduações, quantos semestres são
dedicados a essa língua?, notamos que há uma grande
variação: enquanto na Universidad Nacional de Cuyo, no curso de Turismo, há 4 semestres de LP e na Universidad Católica de la Plata, no mesmo curso, existe
apenas um semestre. A maioria das graduações oferece dois semestres de LP,
exceto os cursos que formam professores de português, que têm 8 semestres de
LP. Já no Paraguai, os cursos variam entre um e quatro semestres. Por exemplo,
a Universidad Artística y Politécnica del Paraguay, no curso de Periodismo,
da sua grade curricular constam quatro semestres de português, enquanto a Universidad Tecnológica Intercontinental somente tem um
semestre com um curso de mesma denominação. No Uruguai, os semestres dedicados
à LP são os menores, de um a dois. Apenas constatamos no curso de Licenciatura en Relaciones Internacionales na Universidad de la Empresa que há 4 semestres de LP. Este é
também o único no país a oferecer a LP num curso de Abogacía,
mesmo que seja apenas um
semestre.
Ainda que haja avanços institucionais e legislativos, no sentido de ampliar a oferta da LP nos países fundadores do Mercosul, há muito o que se fazer ainda. Se, por um lado, no contexto político linguístico/educacional, deve-se pôr em prática o que já é lei no Mercosul, por outro lado, deve-se criar uma “consciência universitária” no que concerne à valorização do português, o que, com efeito, não significa desvalorizar as demais, mas dar mais espaço às línguas da região na universidade. Possivelmente, para tal, isso requer tomadas de consciência de ações que tirem o monopólio, quase que exclusivo, dado ao inglês (Gusmão, 2015), ainda que o português seja a língua da região de maior valor econômico, em decorrência das relações comerciais que a Argentina, o Paraguai e Uruguai têm com o Brasil, como já citado e repaldado por autores como Gusmão (2015). Nesse sentido, o trabalho empreendido requer que pesquisas futuras sejam realizadas, verificando se o número de resultados recopilados relativos ao ensino de português nas universidades do Mercosul se mantém, aumentaram ou até mesmo diminuiram e seu impacto nas diversas áreas. Isso é necessário para um planejamento assaz de política linguística de PLE.
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Notas biográficas
José Genival
Bezerra Ferreira
ORCID:
https://orcid.org/0000-0001-6635-6307
Email:
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Morada: Universidad
de Santiago de Chile, Av. Libertador Bernardo O'Higgins
1058, Santiago de Chile/ Chile